Furacão Melissa atinge Jamaica com ventos de 295 km/h e pressão recorde
out, 29 2025
O Furacão Melissa tocou terra na Jamaica na terça-feira, 28 de outubro de 2025, às 8:45 UTC, como o ciclone mais poderoso já registrado na história da ilha. Com ventos sustentados de 295 km/h e pressão atmosférica de 892 milibares, o sistema — classificado como Categoria 5 na escala Saffir-Simpson — deixou cidades inteiras sob água, estradas destruídas e milhares sem energia. Cerca de metade da população jamaicana, que soma 2.853.877 habitantes, está diretamente afetada. Mas o que torna Melissa ainda mais assustador não é só sua intensidade, mas sua lentidão. Avançando a menos de 6,4 km/h, o furacão está parado sobre a ilha como um monstro lento, despejando até 1 metro de chuva em algumas regiões — o suficiente para desencadear deslizamentos de terra em montanhas já saturadas.
Por que o furacão está tão forte e tão lento?
A resposta está no oceano. Segundo o Centro Nacional de Furacões dos EUA, as temperaturas da superfície do mar no Caribe Ocidental estão em torno de 30°C, ou seja, 2 a 5°C acima da média histórica para esta época do ano. O meteorologista César Soares, do Climatempo, explica: “Temperaturas assim são como gasolina para um furacão. Eles não criam vento — eles alimentam o que já existe.” O calor excessivo do mar fornece energia para a intensificação rápida, e Melissa passou de tempestade tropical a furacão de Categoria 5 em menos de 72 horas — um ritmo que, há duas décadas, seria considerado raro.Ainda mais preocupante é o papel da La Niña. O fenômeno climático, que está ativo no Pacífico, reduz a cisalhamento do vento na bacia do Atlântico — ou seja, a diferença de velocidade e direção do vento entre as camadas da atmosfera. Normalmente, isso desestrutura furacões em formação. Mas agora, com o cisalhamento quase inexistente, os sistemas têm liberdade total para crescer. “Na La Niña, os padrões de circulação da América do Norte favorecem não só a formação, mas também a estagnação dos ciclones”, acrescenta Soares. É por isso que Melissa não está se movendo. Não é um erro de previsão. É uma combinação letal de fatores.
Um verão de furacões que ninguém previu, mas todos temiam
A temporada de furacões no Atlântico de 2025 já começou com um sinal claro: o Furacão Erin, o primeiro da temporada, atingiu Categoria 4 em julho. Desde então, o Centro Nacional de Meteorologia dos EUA e o Colorado State University reforçaram suas previsões. Enquanto a média entre 1991 e 2020 era de 14 tempestades tropicais por ano, com cerca de 3 grandes furacões, os modelos deste ano apontam para 17 tempestades, sendo 9 furacões e 4 de categoria major (acima de 179 km/h). Melissa é o primeiro a cumprir essa previsão de forma brutal.Os dados são claros: o Atlântico está se tornando um caldeirão. Nos últimos 30 anos, a frequência de furacões de Categoria 4 e 5 dobrou. E a intensidade média dos sistemas aumentou em 15%. Isso não é coincidência. É o efeito direto do aquecimento global, que não só eleva as temperaturas oceânicas, mas também altera os padrões de vento e umidade. “Agora, não estamos mais falando de ‘tempestades extremas’ — estamos vivendo o novo normal”, diz um meteorologista da Universidade da Flórida, que pediu anonimato por políticas institucionais.
As consequências que ainda não vimos
Jamaica não tem infraestrutura para resistir a um impacto desse porte. A maioria das casas nas áreas rurais é de concreto mal reforçado ou madeira. As redes elétricas são antigas. Os sistemas de drenagem, em cidades como Kingston e Montego Bay, foram projetados para chuvas de 20 anos atrás. Com 1 metro de chuva em 48 horas, os rios transbordam, os barrancos desabam e os hospitais perdem energia. O governo jamaicano já declarou estado de emergência nacional. A Cruz Vermelha mobilizou equipes de resgate, mas o acesso a algumas regiões montanhosas ainda é impossível.E o pior pode ainda vir. Melissa não vai se dissipar rapidamente. A previsão é que continue sobre o Caribe até sexta-feira, com risco de se mover para Cuba e, depois, para os Estados Unidos — possivelmente como um furacão de Categoria 3. O Centro Nacional de Furacões já emitiu alertas para a Flórida e as Bahamas. O que aconteceu na Jamaica pode ser só o começo.
Por que isso importa para o Brasil?
Pode parecer distante, mas não é. O aquecimento das águas do Atlântico Tropical afeta todo o hemisfério. O mesmo calor que alimenta Melissa também contribui para a intensificação de tempestades no Nordeste brasileiro. E os padrões de La Niña, que estão por trás deste furacão, também aumentam a chance de secas prolongadas no Sertão e chuvas torrenciais no Sul. Além disso, o Brasil é um dos maiores importadores de produtos agrícolas da Jamaica — café, banana, rum. A destruição da produção local pode gerar aumento de preços nos supermercados brasileiros nos próximos meses.“A gente não está apenas presenciando um furacão. Estamos testemunhando um sinal de alerta que o planeta já enviou há décadas”, diz a climatologista Ana Lúcia Mendes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “A pergunta não é mais se isso vai acontecer de novo. É quando.”
Frequently Asked Questions
Como o aquecimento dos oceanos está mudando os furacões?
O aquecimento dos oceanos fornece mais energia para os furacões, permitindo que eles se intensifiquem mais rápido e atinjam categorias mais altas. Em 2025, a temperatura da superfície do mar no Caribe estava até 5°C acima da média, o que ajudou o furacão Melissa a passar de tempestade tropical a Categoria 5 em menos de três dias — algo que antes levava uma semana. Estudos mostram que a frequência de furacões de Categoria 4 e 5 dobrou desde 1990.
Por que o furacão Melissa está se movendo tão devagar?
A lentidão é causada por um bloqueio atmosférico associado à La Niña, que enfraquece os ventos de altitude que normalmente empurram os furacões. Sem essa força, o sistema fica estacionário ou avança em ritmo de caminhada — menos de 6 km/h. Isso significa que uma única área recebe chuvas extremas por dias, aumentando drasticamente o risco de inundações e deslizamentos — o que aconteceu na Jamaica, onde algumas regiões receberam até 1 metro de chuva.
A La Niña realmente aumenta a atividade de furacões no Atlântico?
Sim. Enquanto a La Niña reduz a atividade no Pacífico, ela diminui o cisalhamento do vento no Atlântico, criando condições ideais para a formação e intensificação de ciclones. Nos últimos 40 anos, 7 das 10 temporadas mais ativas no Atlântico ocorreram durante eventos de La Niña. Em 2025, esse padrão se repetiu, e os modelos climáticos já haviam previsto uma temporada acima da média — Melissa é a prova disso.
O que a Jamaica pode fazer para se preparar melhor?
A Jamaica já começou a reconstruir com normas mais rígidas: casas elevadas, telhados resistentes e sistemas de drenagem modernos. Mas o custo é alto. O governo estima que a recuperação de Melissa exigirá mais de US$ 2,3 bilhões — quase 20% do PIB do país. A ajuda internacional é essencial, mas a verdade é que pequenas ilhas como essa não têm recursos para se adaptar sozinhas. A solução passa por financiamento climático global e transferência de tecnologia.
Essa situação vai piorar nos próximos anos?
Sim. A ciência é clara: se as emissões de carbono continuarem no ritmo atual, até 2050, os furacões no Atlântico serão, em média, 10% mais intensos e 20% mais lentos. Isso significa mais destruição por evento e mais tempo para que os danos se acumulem. Os modelos climáticos apontam que eventos como Melissa podem se tornar comuns — não mais raros — até 2040. O futuro não é incerto. É já aqui.
O Brasil está em risco direto de furacões como Melissa?
O Brasil não sofre furacões diretos porque a temperatura do Atlântico Sul é geralmente muito fria para sustentar ciclones tropicais. Mas os efeitos indiretos são reais: padrões climáticos alterados pela La Niña e pelo aquecimento global aumentam a frequência de tempestades severas no Nordeste e enchentes no Sul. Além disso, a economia brasileira é afetada pela desestabilização de cadeias de suprimento — como o café jamaicano — que se tornam mais caros ou escassos.